domingo, 5 de outubro de 2014




Igualdade: aspectos jurídicos sobre ideias pré-concebidas

 Os juízos de valor não devem nortear a atuação dos juristas, sejam acadêmicos de Direito, advogados, defensores públicos, magistrados, etc.. Como conhecedores da ciência jurídica, é indispensável tratar os indivíduos de forma igualitária, é o norte primário. Seja dentro do processo, com relação às partes, seja mesmo no dia a dia, para que a cada momento se instale no coração uma noção da verdadeira igualdade. Mas não no sentido de mudar os pensamentos de alguém, isso ninguém pode fazer arbitrária e esporadicamente (eis que é impossível estar isento de alguma forma, mesmo que pequena, de senso comum), mas no sentido de não se dirigir a alguém com algum "pré-conceito". É importante respeitar, olhar o outro como humano que és, como um sujeito detentor de direitos e deveres mas, antes de qualquer coisa, um sujeito que merece ser respeitado, independentemente de sua forma de ser.
Neste contexto, veja-se que mesmo cabendo ao magistrado a função de julgar a causa, ele tem seu poder judicante regulado por princípios e dentre eles o princípio da imparcialidade do juiz, que dita que o "juiz está cima e entre as partes, não podendo proferir sentença levando em consideração seus desejos internos, suas convicções". Ele deve atuar com valores jurídicos, legais, sociais, psicológicos, econômicos e outros para dar uma decisão, mas jamais levando em conta seus conceitos íntimos com relação aos fatos ou às partes.
Partindo desta premissa, os juristas devem eximir-se de "julgar" fatos ou pessoas. Não que deve-se abdicar dos pensamentos internos já formados pela cultura e criação de cada qual, mas que não deve-se impingir eles na realidade que se apresenta. Uma convicção seja ela de ordem religiosa, social ou econômica não pode jamais prejudicar a atuação profissional de alguém.
Sabido é que a atualidade é uma sociedade de aparências, uma sociedade que julga pelo que vê, pelo que ouve; uma sociedade que não constata muito do que ela mesmo produz, não busca a verdade dos acontecimentos ou a essência das pessoas. Infelizmente é um estado de acomodação, um estado ao mesmo tempo de capitalismo naufragador, que emerge e tira os últimos sentidos de igualdade quando se está em jogo o poder de comprar algo. Isso se instala no coração de muitas pessoas produzindo sentimentos de superioridade que distorce os conceitos político-culturais. Vive-se num momento consumista onde existe uma massa que não ganha o suficiente para se enquadrar também nos "padrões". Outrossim, a contemporaneidade é muito mista em pensamentos, ações, culturas, por conta das mudanças que vem ocorrendo nos últimos anos. Desde de 1988 a nossa Carta Maior tenta balancear esta diversidade com o princípio da igualdade: "Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.". E para cumprir este dispositivo legal e respeitar a igualdade como princípio nele preconizado faz-se mister ter uma certa imparcialidade, sendo jurista que se é e mesmo acadêmico, pois que respeitar cada um é permitir-lhe uma parcela de direito para exercer sua liberdade.
Não convém, portanto, que alguém tenha um trato social baseado no preconceito. Assim, vale analisar a forma como se age no seio jurídico atualmente. Que sejam afastadas as divisões de caráter pessoal para com os demais, e a sociedade jurídica honre aquilo que se busca há tempos: o direito à liberdade.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Contando uma breve anedota

 Estava eu esperando atendimento numa salinha de um certo órgão público e olha só que observação curiosa fiz: a pessoa que iria me atender estava conversando lorotas com outra colega de sala e, acho eu, que havia esquecido de me chamar (minha senha já era a próxima). Pensei nas imbricações desta questão. Fiquei quase quinze minutos esperando e ouvindo as conversas bobas sendo jogadas fora. Ai não aguentei e intervim, fui lá dentro e exigi atendimento. As duas pessoas me olharam com um certo orgulho ferido misturado com “não estou nem aí pra você e seus problemas”. E o pior de tudo? Apenas esperei tanto tempo pra descobri que tinha de preencher uma reles ficha e marcar de voltar outro dia! Foram dois minutos e pronto, tudo certo e chamariam o próximo cidadão da vez.

Com isso pensei seriamente: “por que esta falta de respeito comigo, que pago meus impostos e sou o fator-gerador dos órgãos públicos?”; “por que estes servidores públicos não entendem que não se trata de gostar ou não de mim ou do serviço, mas que estão ali para atender da melhor maneira possível?”
E é isso que ocorre a cada instante no Brasil, uma falta completa de respeito e responsabilidade conosco, os cidadãos, o povo. Sem nossa demanda, sem a construção do Estado nesta máquina administrativista, sem os impostos e os serviços públicos, não iriam existir órgãos e consequentemente não existiriam aqueles “profissionais” que não quiseram deixar para outro momento a conversa fútil e atender as pessoas. É tudo um conjunto encadeado de situações (ou ao menos deveria ser) que compõem, por lei, a estrutura da nação.
Mas o que mais vejo e realmente entristece, é a infringência em larga escala dos princípios explícitos da administração pública (caput art. 37, CF/88): legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Este último é o que mais atormenta o cidadão, que ao chegar em qualquer repartição pública pretende ser atendido com rapidez ou no mínimo qualidade e atenção. Mas podemos perceber também que é infringido o princípio da impessoalidade, pois na mente de muitos funcionários públicos merece melhor atendimento quando “se vai com a cara”. É inegável que também há pessoas irritadas que chegam em qualquer lugar e se prestam a cena de armar confusões sem causa e estes não são vistos com bons olhos por servidor algum. Mas vamos concordar que são pouquíssimos os que assim agem, pois há uma parcela que inconformada acaba por gerar briga achando ser a melhor forma de obter seus direitos.
Acredito que anterior a qualquer norma há a consciência do indivíduo, que deve ter uma conduta norteada pela ética no encaminhando das relações de trabalho. Ou seja, mesmo que haja normas, é a consciência do dever-ser da pessoa que a leva a fazer o correto no desenvolvimento de seus trabalhos, e isto se aplica também à administração pública, pois sabemos que não são todos os servidores que têm mal proceder.
Necessário se faz observar que é uma realidade a desídia e ociosidade de alguns indivíduos nas organizações públicas, o que muitas vezes é ocasionado por falta de motivação. Mas infelizmente em outros casos por falta de ética, falta do interesse de cumprir os deveres (e é isso gera uma forte descrença da sociedade com relação ao serviço público).
A falta de motivação não está somente relacionada à baixa remuneração (em alguns casos, devo citar), mas também ao ambiente em que as atividades são desempenhadas, às pessoas que compõem aquele espaço e à cultura organizacional (que muitas vezes é inflexível a mudanças).
Por outro lado, a falta de consciência do dever-ser leva a uma devastadora incompetência na realização das atribuições dos servidores, visto que isso reflete seus desempenhos e muitas vezes outros se espelham em atitudes alheias e vai ocorrendo uma certa doença contaminadora, o que poderíamos chamar de uma “epidemia funcional pública”, se alastrando e deixando uma insatisfação progressiva, em que uns vão fazendo aquilo que os outros fazem, mesmo que errado, desumano, ilegal, caótico, enfim. E não digo todos, pois sabemos que há órgãos louváveis em sua estrutura administrativa e também há servidores, mesmo dentro das péssimas instituições, que não medem esforços em realizar suas atividades corretamente.
É sabido que existe uma gama de outros problemas a ser resolvidos, como a falta de funcionários, os poucos recursos financeiros, a péssima gestão, entre outros. Mas estas não são as desculpas para que alguém não cumpra seu dever, que está inclusive previsto legalmente (art. 116 da Lei n° 8.112/1990). É preciso um esforço conjunto, uma atitude que deve ser endógena (de dentro para fora), deve partir primeiro de dentro das organizações e mesmo que aos poucos ir ganhando espaços e melhorando o trabalho das instituições públicas.